De volta ao degrau anterior

Eu iria escrever sobre Brasil e Suíça, apenas sobre um jogo da copa, o primeiro. Dada a perda de timing, se viu a oportunidade de falar sobre o que foi a copa do mundo de 2018. Da participação brasileira a decisão que consagrou a multinacional seleção francesa como campeã do mundo pela segunda vez na história.

O clima de copa do mundo só chegou ao Brasil às vésperas. Por mais que mídia e comércio puxassem o assunto, o povo só passou a falar de copa e de futebol, a poucas semanas do certame. E, para provar que o brasileiro tem um pouco de memória, as camisetas do Brasil preferidas para a compra foram as azuis em vez da tradicionais amarelas, graças ao movimento manifestoche de 2016.

E assim o escrete canarinho entrou em campo, em um domingo de churrasco. Resolvi acompanhar o jogo a distância, aproveitando o toque de recolher coletivo para andar pela rua, e acompanhei o jogo pelo rádio, e também pelo Twitter. O clima de euforia cedeu lugar a apreensão e nervosismo. O jogo acabou empatado.

O segundo jogo do Brasil foi a primeira vez em muito tempo que o time entrou em campo pressionado para vencer. E a vitória só veio nos acréscimos, após muitas tentativas pouco produtivas e atuação consagrada do goleiro da Costa Rica. Já a terceira participação brasileira foi contra a Sérvia, que tinha uma retranca e que foi vencida ainda no primeiro tempo com um lançamento preciso de Philippe Coutinho, que encontrou Paulinho e com um toque, venceu o goleiro.

Enquanto isso, a Argentina passava no sofrimento em seu grupo e a Alemanha se despedia melancolicamente da copa, com uma derrota para a Coreia do Sul.

As oitavas de final chegaram, e o Brasil encarou o México. Foi o auge do Brasil no certame. Atuação segura, jogo coletivo é um 2 a 0 que deu esperanças ao torcedor.

E enquanto isso, Argentina, Espanha,  Portugal e outros se despediam do certame. O embate entre Argentina e França, vencido pelos Bleus, foi a melhor partida da fase: 7 gols e 4 a 3 para os franceses.

As quartas de final marcaram o domínio europeu na copa. Os dois times fora desse continente, ambos sul-americanos, caíram nas quartas. O Uruguai perdeu da França e o Brasil, bem...

O Brasil perdeu para uma bem postada e eficiente seleção belga. Foi um 2 a 1 de emudecer o torcedor. O primeiro gol foi de bola aérea: em cobrança de escanteio, Fernandinho tentou impedir a cabeçada e seu toque de cabeça foi para o gol de Alisson. O segundo gol belga foi uma aula de contra-ataque. Os belgas, frios, mataram o jogo em dois lances. Sabendo das deficiências do time do Brasil naquele jogo. Tite foi voluntarioso, fez o que pôde. Mas não conseguiu reverter a situação para o time brasileiro.

Neymar embarcou na copa como esperança e saiu pela porta dos fundos. Não o vejo como vilão, mas como exemplo do que o futebol atual se transformou: uma fábrica de polêmicas. Questões políticas envolvendo imigrantes em seleções europeias, machismo e homofobia na Rússia, catimba e simulações em campo e até mesmo o excesso de drama ao receber faltas foram para a inquisição da audiência rotativa digital. Neymar foi caçado em campo, expediente típico do último recurso de jogadores extenuados por uma exaustiva temporada europeia recém-findada. E mesmo com o recurso do VAR, a arbitragem do atual certame foi conivente com a violência e o anti-jogo. Salvo se a FIFA fizer uma bobagem, como espremer as férias do verão europeu, a copa de 2022 no Qatar, será a melhor no quesito de desempenho dos jogadores, e terá um nível técnico melhor, por ser realizada entre outubro e novembro. Por outro lado, Neymar não é inocente também, parte do fracasso do Brasil passou por seus pés. O ataque do Brasil se tornou lento e previsível. Neymar por diversas vezes optou pelo embate direito com a defesa adversária ao passe, e por vezes não aproveitou o fato de ser caçado em campo para ficar mais perto da área para obter vantagem nas faltas recebidas.

Tite poderia se consagrar por ser um técnico eficiente, mas mostrou-se com algumas limitações que o compromete. A primeira foi não haver um plano B para a ausência de Daniel Alves. Ficou visível que o lado direito do ataque foi pouco aproveitado, e isso sacrificou Gabriel Jesus e William. Mesmo com a boa atuação de Fagner, sua função tática se limitou a defesa e não foi muito bem aproveitado ao atacar. Cruzou pouco, avançou com velocidade, mas quase sempre para passar a bola para os meias. Também se notou um pouco de prepotência, e teimosia do treinador, que mesmo se mostrou ser incoerente. Roberto Firmino estava em melhor fase e condições que Gabriel Jesus e era sempre preterido pelo Tite. Poderia ter sacado Fernandinho, recuado Paulinho, e colocado Firmino no jogo, após tomar o segundo gol dos belgas. Preferiu esperar uma reação do time que não veio. Talvez seja melhor evitar as divagações do tipo "e se", pois cada um dos 200 milhões de técnicos brasileiros teriam uma visão diferente do jogo, e, por isso, a visão de Tite, embora criticável, é respeitável. E aposto nele para um projeto para 2022. Tem plenas condições de corrigir as falhas de percurso e conduzir a uma respeitada e, quiçá, vitoriosa trajetória.

E com as semifinais exclusivamente europeias, calaram-se os críticos. Primeiro os belgas, que sofreram com uma eficiência ainda maior do que as que fizeram contra o Brasil, por parte do time francês, e saíram da rota do título pelo placar mínimo. Após o jogo do Brasil, jogadores belgas falaram muito. E calaram-se após a derrota para a França. E depois os ingleses, que cederam a virada para o time croata na prorrogação. A imprensa inglesa foi a que mais cornetou, com piadas de gosto bastante duvidoso, como a do tabloide inglês que disse que a Inglaterra tem Kane e a Colômbia, cocaine (cocaína em inglês), no dia do embate entre as duas seleções pelas oitavas de final. As críticas excessivas a Neymar e a outros craques da copa, além das celebridades inglesas cornetando o futebol. A derrota do time inglês, confirmada pela apatia na disputa pelo terceiro lugar, também perdido para a Bélgica, confirmaram um time que não soube ganhar, tampouco perder.

A final foi um epílogo de uma copa que apesar das polêmicas que tiveram mais destaque que o jogo jogado, foi uma das mais marcantes dos últimos tempos. Muitos gols, inclusive com muitos gols de bola parada, o sucesso do VAR (apesar de alguns pontos nas quais deveria ter intervido ou que interviu de forma duvidosa), grandes jogos e apenas um jogo terminado em zero a zero na primeira fase. O placar de 4 a 2 entre França e Croácia mostrou um futebol progressista, com intensidade do início ao fim e lances capitais.

O começo do jogo com domínio croata foi interrompido pelo gol francês, oriundo de uma cobrança de falta (falta essa inexistente) e com gol contra de Mandzukic. Depois houve a reação croata com um belo gol de Perisic, mas o mesmo Perisic, de forma intencional ou não, pôs a mão na bola dentro da área, ato detectado pela arbitragem de vídeo. Pênalti cobrado por Griezmann e a França novamente estava em vantagem. No segundo tempo a Croácia tinha que reverter a vantagem, mas faltou fôlego, talvez por ter enfrentado três prorrogações seguidas. E sucumbiu ao ataque francês. Pogba e Mbappé marcaram seus gols e a França caminhava a seu bicampeonato. Mesmo com a falha bisonha de Lloris e o gol que redimiu Mandzukic (talvez o único jogador na história das finais de copa a marcar um gol contra e outro a favor), o título ficou com os franceses.

E as ruas enfeitadas brasileiras, muitas delas ainda estavam assim após a eliminação do Brasil no mundial. De certo as pinturas nas ruas vão demorar pra apagar, assim como demorarão para ser esquecidas, ou nem mesmo serão, as lembranças de uma copa do mundo. Mas para uma pessoa, a copa do mundo foi a mais vitoriosa de sua vida. Walter Casagrande Júnior, comentarista de futebol e dependente químico em recuperação, venceu o jogo da vida ao cobrir a copa na Rússia sóbrio. Talvez seja o exemplo de vida que devemos levar pras nossas vidas. 

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